E se fosse Santo Antônio?

E se fosse Santo Antônio?

Professor Nazareno*

Como de costume, a tragédia que se abateu sobre Brumadinho em Minas Gerais, quando se rompeu uma barragem da Mineradora Vale matando centenas de pessoas, serviu para os brasileiros tentarem colocar a “tranca na porta” depois de ela ter sido arrombada. A tragédia se repete depois de apenas três anos, quando a mesma mineradora teve outra barragem rompida em Mariana matando 19 pessoas e causando danos irreparáveis à natureza. “Os brasileiros não apreendem com as tragédias e as deixam se repetirem com uma frequência incrível”, é o que se fala. As providências só são tomadas na hora em que acontece a hecatombe, depois todos se esquecem do fato e a vida continua normalmente. Foi assim com a boate Kiss em Santa Maria no Rio Grande do Sul, foi assim com Mariana e será assim, infelizmente, com Brumadinho.

Por isso, uma pergunta que não quer calar e que nos assusta diariamente é sobre a situação das hidrelétricas no rio Madeira. E se este fato tivesse acontecido com a barragem de Santo Antônio que está a apenas sete quilômetros da capital? Essas barragens são mesmo seguras a ponto de reter toda a água e resíduos do caudaloso rio? E em caso de rompimento, que medidas seriam adotadas para salvar vidas a jusante do rio? Claro que quando se levantam essas hipóteses, o pessoal das duas hidrelétricas sai rapidamente em defesa de seu empreendimento se esquecendo de que estamos no Brasil, país onde o que vale é só o lucro imediato das empresas e jamais a vida de pessoas inocentes. Porto Velho, a suja, mal cuidada e fedorenta cidade, tem quase 600 mil habitantes no caminho direto das águas enfurecidas em caso de um rompimento.

Não haverá tempo suficiente para avisar a ninguém em caso de tragédia. Que tipos de treinamento são feitos com as pessoas que moram em bairros como Triângulo, Baixa da União, Balsa e no centro da cidade? E as áreas ribeirinhas como São Carlos, Calama, Nazaré, Humaitá e inúmeras outras localidades rio abaixo? São duas grandes hidrelétricas a montante de um dos maiores e mais caudalosos rios do mundo. É muita água em caso de rompimento. Se Jirau arrebentar, Santo Antônio não consegue segurar as águas e se for Santo Antônio, essas mesmas águas levariam poucos minutos para inundar todo o centro da capital e provocar a morte imediata de milhares de pessoas além dos prejuízos incalculáveis. Dizer que isto nunca acontecerá é uma rotina macabra que faz lembrar a trágica história do Titanic: “nem Deus afunda este navio”, diziam.

As usinas de Jirau e de Santo Antônio em Rondônia podem se romper, sim. São obras feitas por seres humanos num país onde o que vale é o “jeitinho”. Óbvio que ninguém espera muito menos torce para isso acontecer. Mas construir uma hidrelétrica a poucos quilômetros de uma área urbana densamente povoada é de uma estupidez sem tamanho. Além do mais, que benefícios essas construções trouxeram para Rondônia e para seu povo? Até a conta de energia elétrica para os rondonienses aumentou de forma absurda nos últimos dias. Durante a enchente histórica de 2014, que pode ter sido por culpa dessas construções absurdas, Santo Antônio e Jirau ficaram jogando a culpa uma na outra. A fiscalização deve ser redobrada e os executivos dessas empresas precisam mostrar à população que tipos de providências tomarão em caso de catástrofe, pois nada mais poderá ser feito quando corpos de rondonienses aparecerem boiando em Macapá.

*É professor em Porto Velho

Autor / Fonte: Professor Nazareno

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